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A firmeza de quem lutou contra o golpe de Estado de 2016

Guilhermina Marrati não queria chorar. Disse pra si mesma, antes de sair de Vitória, no Espírito Santo, na quarta-feira (11) à tarde, que o governo de Dilma Rousseff não havia acabado, mas apenas sofrido um ataque mais duro dos conspiradores nacionais.

Justamente por isso decidiu pegar o ônibus com destino a Brasília e encarar as 17 horas de viagem entre as duas cidades: queria ser mais uma entre a multidão de pessoas que presenciariam, talvez, o começo da luta da presidenta contra o golpe de Estado que sofrera durante a madrugada – do qual foi notificada na manhã desta quinta (12).

A promessa, no entanto, durou cerca de uma hora. Após o discurso da presidenta na rampa do palácio perante as milhares de pessoas que a ouviam, Guilhermina resolveu segui-la durante o breve período em que abraçou e beijou alguns manifestantes.

Quando Dilma entrou em uma SUV preta e, rodeada de carros oficiais, sumiu no horizonte de Brasília rumo ao Palácio da Alvorada, caiu em um pranto sepulcral sobre o meio-fio da Praça dos Três Poderes.

“O choro não é por causa da Dilma. Eu nem conheço ela, não sei como ela é, se ela é realmente brava, como muitos falam. O choro é por causa do que essa saída dela do Palácio do Planalto representa ao Brasil. Um completo retrocesso da nossa democracia que eu nem sei como explicar aos meus alunos”, conta. Ela é professora de história do ensino médio na rede pública de Vitória há dez anos.

Eduardo Ribeiro, ao contrário de Guilhermina, não precisou se conter. Veio a Brasília durante a madrugada imaginando que o golpe pudesse ser revertido no Senado – onde estava sendo votado enquanto atravessa a Bahia.

O auxiliar administrativo de 32 anos, porém, compartilhava a mesma motivação da professora capixaba: “Ontem (quarta) eu liguei a TV e comecei a ver a votação em casa. Pensei: ‘Ué, se eu não acho esse golpe legítimo o que eu vou fazer ficando aqui? Vou pra Brasília’”.

Chegou à capital pela manhã, quando a conspiração contra Dilma havia terminado, e só conseguiu acompanhar o discurso dela na rampa do edifício presidencial e a posterior saída.

Ficou olhando os carros oficiais partirem com a presidenta encostado na grade colocada pela Polícia Militar do Distrito Federal com um sorriso sem graça característico dos derrotados, mas foi o primeiro a puxar o grito de “Dilma guerreira da pátria brasileira” quando todos ainda choravam.

DILMA

Dilma Rousseff falou por aproximadamente quinze minutos ao público postado em frente ao Palácio do Planalto, na Praça dos Três Poderes, com um pedestal improvisado e uma caixa de som relativamente baixa. Ao contrário do usual, não leu nenhum documento pronto e ousou até mesmo quebrar o protocolo e se colocar à frente do móvel que servia para amparar o microfone.

Atrás dela estavam líderes variados, como o ex-presidente Lula, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, o presidente do PT, Rui Falcão, a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-SP) e a presidenta da UNE, Carina Vitral. .

Milhares de pessoas se aglomeraram no local para escutarem as palavras da presidenta, interrompida sete vezes durante o discurso pelos gritos dos manifestantes, ora contra Michel Temer, ora contra Eduardo Cunha, ora enaltecendo o nome dela.

Em todas as interrupções, Dilma esperou pacientemente que o próprio povo fizesse silêncio para voltar a falar.

“Eu estou sendo vítima de um golpe. Chamo isso de golpe porque não cometi nenhum crime de responsabilidade. Os atos cometidos por mim foram cometidos por todos os presidentes que me antecederam. Se não foi crime com eles, não pode ser comigo agora”, disse, de cara.

“Quem conspirou para esse golpe o fez por vingança. O que fez porque nós nos recusamos a dar a ele, ao senhor Eduardo Cunha [interrompida pelas vaias], os votos na Comissão de Ética da Câmara dos Deputados”, continuou.

A presidenta ainda lembrou de sua luta pela democracia durante a ditadura militar, das conquistas sociais do governo e do fato de ser uma mulher, o que colaborou para que ela caísse. “O golpe é machista”, gritaram os manifestantes. O momento em que foi mais ovacionada foi quando disse que era uma “fiadora da democracia brasileira”.

Ao lado de Lula e Jandira Feghali, Dilma distribuiu abraços e beijos aos ocupantes da praça. Lula havia feito o mesmo horas antes, quando chegou ao palácio e se encontrou com a presidenta em seu gabinete. Em um dos momentos, ela foi beijada por uma outra mulher que a instigou a lutar. Dilma, então, respondeu: “Eu vou lutar!”. Depois sorriu e foi engolida pelo restante da multidão.

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Ela ficará no Palácio da Alvorada, próximo ao do Planalto, pelos próximos 180 dias – período em que o Senado vai analisar o processo de impeachment instaurado contra ela pelos parlamentares. No momento em que deixou o Palácio do Planalto, homens do Exército impediram que os manifestantes fossem atrás da carreata oficial.

Os movimentos sociais – entre eles, a UBES – haviam convocado um ato em frente ao local onde Dilma ficará, mas o policiamento impediu que qualquer pessoa se aproximasse do edifício. Protestos devem ocorrer nos próximos dias em frente ao palácio.

O GOLPE

O Senado aprovou – por 55 a 22 – a abertura do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff durante a madrugada desta quinta-feira (12). Durante a noite, a Esplanada dos Ministérios foi fechada para o trânsito de veículos e poucas pessoas podiam caminhar pela região.

A reportagem da UNE percorreu quase todos os jardins do Congresso Nacional e da Praça dos Três Poderes sem encontrar uma única pessoa entre meia-noite e 1h. Apenas na portaria do Senado Federal haviam alguns taxistas e jornalistas. A votação se encerrou às 6h. Dilma foi notificada do afastamento às 10h.

O golpe – conspirado por Michel Temer e Eduardo Cunha – se materializou já na tarde desta quarta: às 11h, o agora presidente recebeu deputados no Palácio do Jaburu, onde estava instalado, assinou o documento de posse interina do cargo e, em seguida, se preparou para ir ao Palácio do Planalto.

Antes, ele divulgou a lista de ministros do seu governo – relação esta que não tem nenhum negro e nenhuma mulher e coloca em cargos federais nomes como José Serra (PSDB), nas Relações Exteriores, Alexandre de Moraes (o truculento ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo), na Justiça, e Blairo Maggi (conhecido como “Rei da Soja”), na Agricultura.

Sete ministros nomeados por Temer tem problemas com a Justiça, além do próprio presidente, citado em diversas delações da Operação Lava Jato da Polícia Federal.

A UBES se posicionou em resistência ao falso governo e convocou a juventude a ocupar as ruas. A luta, para nós, apenas começou. Veja em nota oficial da entidade aqui,

FOTO: Cuca da UNE.