Convidada a participar de uma mesa no 3º Encontro Nacional de Grêmios, a estudante Ana Júlia Ribeiro demonstrou no ENG a mesma lucidez que sensibilizou o Brasil no fim do ano passado, ao discursar na Assembleia Legislativa do Paraná em favor das ocupações das escolas. No debate “Grêmios estudantis e ocupações: organizando eu posso desorganizar!”, a paranaense de 16 anos fez um balanço das mobilizações das quais participou a partir de setembro de 2016, consideradas as maiores do movimento estudantil desde os anos 1990.
Quando começa a falar sobre os acontecimentos de 2016 e o que vem pela frente, a timidez da garota vai dando lugar a um discurso consistente e articulado. Ela ressalta, quanto ao encontro de líderes estudantis, a necessidade de cada participante multiplicar o conhecimento e consciência: “É importante nos reunirmos, mas é importante também levarmos à frente toda a bagagem deste encontro para nossos colegas e para escolas ainda sem grêmio, como é o caso da minha”. Confira abaixo a entrevista na íntegra:
Ana Júlia: Primeiro porque as ocupações de 2016, a partir da Medida Provisória 746, começaram no Paraná, em São José dos Pinhais, daí foi para Curitiba, e a informação começou a circular pela região. Em seguida foi ocupado o colégio Central, o maior do estado, e isso só deu mais gás para a mobilização local. Quando já havia 400 escolas ocupadas no Paraná, os outros estados começaram a se mobilizar também.
Ana Júlia: As ocupações proporcionam muito o desenvolvimento de trabalho em equipe, união, solidariedade.
Isso me deu uma experiência pessoal muito grande de como interagir com as outras pessoas e como construir algo em grupo.
Acho que deve ter sido o maior ponto positivo que aconteceu comigo nas ocupações, e acredito que com muitos estudantes também. Mais do que no dia a dia em sala de aula, com certeza. Na ocupação você precisa se preocupar com o outro, você se solidariza.
Ana Júlia: Acho muito importante e fico honrada em participar, mas é importante também trabalharmos para que isso chegue mais às escolas.
Tem muitas escolas que ainda não sabem que isto está acontecendo, escolas sem grêmio, sem mobilização. Principalmente nós, que estamos aqui, temos que levar isto adiante.
É um evento lindo, de bagagem extraordinária para levarmos para nossas cidades, nossas escolas, nossos colegas.
Ana Júlia: Ninguém nega que se precise de uma reforma do Ensino Médio (e do ensino como um todo), nem que a reforma tenha pontos positivos.
O problema é que esta história de que o estudante vai escolher o que quer estudar é uma furada. Na verdade, a escola que vai escolher o que proporciona. Isto causa um grande problema aos estudantes das periferias.
A MP também traz uma formação técnica muito mais à frente da formação humana. Não admitimos isso. Não queremos ser máquinas para o mercado de trabalho. Com as ocupações, conseguimos o retorno das disciplinas de filosofia, sociologia, artes e educação física [na base nacional curricular comum]. Foi uma das vitórias, uma vitória parcial. No mais, a MP nada mais é que um caminho para a privatização da escola pública. E o notório saber, permitido no ensino técnico, prejudica o ensino.
Ana Júlia: Infraestrutura, não ter um investimento em melhores condições para termos aulas de maneiras mais diversas. A baixa escolarização dos professores e a falta de valorização profissional dos professores. E a falta de estímulo para o estudante – falta uma ponte entre o aprendizado e a vida.
Por Natália Pesciotta, de Fortaleza