“Por Edson Luís, Por Marielle”. O ato histórico chamado por secundas e outros movimentos nos 50 anos de morte do estudante Edson Luís, 28 de março, não poderia ter endereço diferente no Rio de Janeiro: a igreja da Candelária, que virou um caldeirão na missa de sétimo dia de Edson, em 1968, e também recebeu o ato interreligioso em homenagem a à vereadora Marielle Franco, na última semana. Os dois assassinatos políticos, Edson e Marielle, transformaram o Rio em centro de luta.
“Foi o espetáculo mais impressionante que eu vi em minha vida.” Assim Vladimir Palmeira, presidente da AME do Rio de Janeiro em 1968, lembra do cortejo de 50 mil pessoas no dia em que morreu Edson Luís.
O fotógrafo Antonio Mari, que na época era um secundarista de apenas 14 anos, também tem memórias fortes: “O clima no Rio era de muito medo e pavor com aroma de gás lacrimogêneo no ar. Tinha sempre um protesto, um movimento, e por outro lado notícias de companheiros desaparecidos”.
Na passeata em homenagem a Edson Luís, não. Impressionava o clima pacífico da comoção, em plena ditadura militar. Acabou a luz na cidade e a multidão carregava tochas improvisadas, além de velas e lanternas doadas na hora, na passeata da Alerj, no centro, até o Cemitério do Caju, em Botafogo.
No livro 1968: O Ano Que Não Terminou, o jornalista Zuenir Ventura dá uma dimensão: “A impressão que se tem hoje, exagerada, é a de que todo o Rio de Janeiro passou pelo velório. Nunca a Assembleia tinha recebido tantas celebridades”.
“Chegavam sem parar alunos, freiras, professores, inclusive pessoas de direita, donas de casa se manifestando pela primeira vez. Parecia que havia uma grande articulação, mas era espontâneo. Uma coisa contraditória: era um enterro, mas imponente, cheio de vida”, define o ex-presidente da AME do Rio, em depoimento a Zuenir Ventura.
Hoje, Antonio Mari lembra das vivências de 1968 ao acompanhar as notícias sobre a execução da vereadora Marielle Franco:
“Não posso evitar traçar um paralelo com o assassinato do Edson Luís. É sem dúvida a primeira execução política desde a ditadura militar e isso me causa enorme consternação”.
Assim como em 1968, chamou atenção a força do luto por Marielle Franco e a união de diferentes setores nas ruas cariocas. “Os atos continuam e nas ruas têm desde crianças a senhoras, gente que saiu do trabalho, gente de todos os partidos e gente que não é de partido. Todos no Rio sentem a dor pela morte da Marielle”, conta Luiza Arruda, secundarista da UEES (União Estadual de Estudantes Secundaristas).
Ela se impressionou com a rapidez da comoção na última quinta (15/3), a partir da notícia da execução na noite anterior, do mesmo modo em que 1968: “Há muito tempo as ruas não se enchiam tão rápido e de forma tão espontânea”.
Antonio sabe bem o que veio depois daquele episódio, 50 anos atrás. Já na missa de sétimo dia do estudante, os presentes tiveram que ser escoltados pelos padres na saída da Igreja da Candelária, ameaçados pela cavalaria da polícia. Qualquer manifestação estava proibida pela Ditadura e foi duramente reprimida. Logo, os colegas de Antonio do movimento estudantil foram transferidos de escola ou desapareceram. A mãe, apavorada, o mandou para a casa de primos no interior.
Por isso mesmo ele apela para a força da juventude neste momento:
“Vocês têm que ir para rua e tentar evitar que a semente do ódio e do caos plantada pela extrema direita germine e cresça neste ano de eleições. Me lembro daquela canção naquele ano conturbado na voz da Gal Costa: ‘É preciso estar atento e forte’.