Para quem defende uma educação pública, gratuita e de qualidade, os 100 primeiros dias do governo Bolsonaro, de 1º de janeiro a 10 de abril, não têm notícias boas. Além de um enorme corte nas verbas, o Ministério da Educação enfrentou desentendimentos e trapalhadas que o fizeram chegar aos 100 dias sem rumos para os problemas da escola pública.
A gestão que se apresentou como técnica tem feito várias tentativas de ideologizar a educação de acordo com as próprias crenças. Para o consultor educacional Cesar Callegari, que integrou o Conselho Nacional de Educação até o ano passado, a falta de planos também é um projeto.
“A meu ver o MEC não tem e nem pretende ter projeto. Por isso, cria distrações como Escola sem Partido, Ideologia de Gênero, Hino nacional e Lava Jato da educação. A própria disputa interna entre grupos não passa de uma distração proposital”, disse Callegari, ao El País.
O coordenador executivo da Ação Educativa, Roberto Catelli, lembra que o Brasil já tem o Plano Nacional de Educação (PNE), válido até 2024. “Mas não vemos uma fala sobre isso, nem a apresentação de políticas públicas que dialoguem com isso”, lamenta.
Veja as ações preocupantes do MEC nestes 100 dias.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, simplesmente cortou 5,8 bilhões de reais da educação. É 25% da verba do MEC este ano!
A única ação efetiva do ex-ministro da Educação foi enviar uma carta, com slogan do governo, para ser lida nas escolas. O próprio Ricardo Vélez teve que voltar atrás dessa “doutrinação”.
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A partir daí, uma briga interna deixa o MEC paralisado. Foram demitidas mais de 10 pessoas do alto escalão em dois meses, além do próprio ministro Ricardo Vélez. Só a dança das cadeiras custou 171 mil reais. Dava para reformar 11 bibliotecas ou pagar o salário de 66 professores.
Além disso, o novo ministro Abraham Weintraub também foi escolhido por Bolsonaro devido a fatores ideológicos e não relacionados à experiência com educação.
2/4: Demissões no MEC em disputa interna já causaram R$ 171 mil de desperdício
Já os principais programas federais seguem indefinidos e sem verba garantida para os municípios e estados, que já cobraram ações para as demandas urgentes, como merenda e transporte. Exemplo de programas sem definições: Mais Educação, Mais Alfabetização, Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar (PNATE) e Programa de Apoio à Implementação da Base Nacional Comum Curricular (ProBNCC)
29/3: Secretários estaduais cobram do MEC foco em demandas urgentes para Educação
Uma das poucas prioridades apontadas, a alfabetização também patina com desentendimentos no ministério. Primeiro suspenderam a avaliação da alfabetização, depois revogaram a suspensão, depois resolveram fazer apenas por amostras. Isso porque era prioridade…
25/3: Governo Bolsonaro suspende avaliação de alfabetização por dois anos
26/3: Governo revoga portaria que suspendia avaliação de alfabetização por dois anos
3/4: MEC quer avaliação de alfabetização de 2019 apenas em amostra de escolas
Paulo Guedes disse ter pronta uma Proposta de Emenda Constitucional para desobrigar governo federal, estados e municípios a investir um mínimo das receitas em educação e saúde. Atualmente, as escolas já enfrentam dificuldades mesmo com o mínimo previsto na Constituição: 18% das receitas para a União, 25% das receitas em estados e municípios.
10/3: Guedes diz ter pronta PEC para desvinculação total no Orçamento
O edital deixava de exigir referências bibliográficas e o compromisso com a agenda da não violência contra as mulheres, promoção das culturas quilombolas e dos povos do campo. Bolsonaro voltou atrás.
9/1: Bolsonaro diz que vai anular mudança em edital de compra de livros
Além de mostrar desconhecer a história brasileira em entrevista, o ex-ministro acha que pode colocar apenas sua própria versão da história na educação.
4/4: Ministro diz que pretende revisar livros didáticos sobre o golpe de 1964 e a ditadura
Uma comissão com apenas três pessoas verificou as questões que podem ser apresentadas no Enem, apesar da prova ser preparada de modo claro por uma equipe técnica do MEC. A atuação da comissão é ideológica e contestada pelo Ministério Público Federal.
20/3: Governo Bolsonaro cria comissão para fazer análise ideológica de questões do Enem
Enquanto isso, o partido do Bolsonaro, o Partido Social Liberal (PSL) apresentou um grave projeto de “Escola sem Partido”, que permite filmar professores e ameaça atividades dos grêmios.
27/3: Novo projeto da Lei da Mordaça mira liberdade dos grêmios