Por Roberta Pontes, Presidenta da UMES-PE
@robertapontespe
“Refletir sobre a trajetória da Lei do Grêmio Livre e toda a sua história, nos mostra que, assim como há 38 anos atrás, quando ela serviu de instrumento para a reconstrução das bases do movimento estudantil secundarista, o seu fortalecimento nos dias de hoje também contribuirá para a reconstrução do nosso país.”
Uma das consequências do Golpe Empresarial-Militar de 1964 foi a proibição arbitrária da atuação das entidades estudantis, assim como a perseguição violenta de seus líderes. A caçada dos militares contra a luta dos estudantes partia de um entendimento do que a organização estudantil significava naquele momento, pois era e é o movimento estudantil organizado que protagoniza as grandes lutas que impulsionam as transformações sociais na história do nosso país. Vencido o período do Golpe, a retomada da democracia, ainda que sob limites e contradições, devolve a autonomia do movimento estudantil. Esse foi o principal motivador da criação da Lei do Grêmio Livre (nº 7.398/1985), de autoria do Deputado Federal Aldo Arantes. A Lei resgatou o direito de livre organização aos estudantes e às entidades estudantis. Completados 38 anos de sua promulgação, precisamos trazer à tona essa conquista dos estudantes brasileiros em busca da afirmação de sua autonomia.
Diante de uma onda crescente de desestimulação da criação de grêmios, encontramos na propagação da Lei do Grêmio Livre um caminho para fortalecer o movimento estudantil secundarista, que sofreu fortes ataques no último período. Com os quatro anos do governo Bolsonaro, em que as nossas escolas estiveram à mercê de grandes ataques e desmontes, a organização estudantil não saiu da mira do governo fascista, que a todo momento atacou e enfraqueceu todas as pautas de lutas que levantamos junto aos estudantes brasileiros.
Seguindo a mesma tática dos anos de 1964, as entidades estudantis e os estudantes sentiram muita resistência para construir a nossa luta dentro das escolas. Isso resultou no enfraquecimento da organização de grêmios estudantis e fez ascender uma falsa proposta de organização estudantil, com o fortalecimento de programas como o “protagonismo juvenil,” que, apesar de pregar que todo estudante é protagonista de sua escola, entrega a autonomia da organização nas mãos da gestão escolar. Isso está bem longe do que nos é de direito.
Refletir sobre a trajetória da Lei do Grêmio Livre e toda a sua história, nos mostra que, assim como há 38 anos, quando ela serviu de instrumento para a reconstrução das bases do movimento estudantil secundarista, o seu fortalecimento atualmente também contribuirá para a reconstrução do nosso país. Esse é um momento onde vamos recolocar no seu devido lugar todas as conquistas que retrocederam durante o governo Bolsonaro. O movimento estudantil secundarista cumpre um papel fundamental para o nosso país e o fortalecimento dessa Lei nos dará caminhos para recuperar a nossa autonomia estudantil.
Muitos estudantes não têm conhecimento da Lei, não se sentem seguros para construir grêmios em suas escolas, sentem-se ameaçados e não são incentivados a exigir essa autonomia. O desconhecimento da Lei 7.398/85 é um projeto político. Se o direito não é conhecido, não pode ser defendido e efetivado. A propagação dessa Lei deve ser nossa responsabilidade no próximo período.
Essa questão nos leva à discussão acerca da meta 19 do atual Plano Nacional de Educação (PNE), que trata da gestão democrática nas escolas, fator contribuinte para o fortalecimento da organização estudantil, já que visa como estratégia a constituição e fortalecimento de grêmios nas escolas, algo que não tem sido efetivado, de acordo com o levantamento feito pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, em parceria com a Iniciativa Nós, o Projeto Seta — Sistema Educacional Transformador e Antirracista e a Ubes (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas).
Segundo a pesquisa, apenas 12,3% das escolas em todo o Brasil possuem grêmio estudantil, enxergados como ferramenta para a construção da gestão democrática nas escolas. O problema é que tampouco as métricas de gestão democrática vêm sendo efetivadas. Pesquisa do IBGE aponta que, em 2019, haviam 161,4 mil diretores nas escolas brasileiras e metade destes chegaram ao cargo exclusivamente por indicação ou escolha da gestão, excluindo a participação da comunidade escolar.
Propagar a Lei do Grêmio Livre, para além de fortalecer o movimento estudantil secundarista, nos ajudará na efetivação da gestão democrática, o que nos leva a uma escola onde a comunidade escolar pauta as necessidades estudantis, fazendo com que avancemos na (re)construção de uma nova escola, em que o protagonismo juvenil estará, de fato, na mão dos estudantes.
São nas raízes das escolas que o nosso projeto de Brasil se firma, essa que é a nossa primeira casa de formação da vida e deve ser ocupada pela voz e ideias dos estudantes secundaristas. Os 38 anos da Lei do Grêmio Livre nos ensina que nossa luta em defesa da organização estudantil deve ser permanente.
Apenas 12% das escolas públicas têm grêmio estudantil – Vermelho
Anuário Brasileiro da Educação Básica 2020 – Gestão Democrática (moderna.com.br)