O espetáculo “Guerrilheiras ou Para a terra não há desaparecidos” estreia hoje (15) no SESC Belenzinho, em São Paulo. A temporada vai até dia 31 de janeiro e traz uma programação paralela de mesas de debate, que começou na última quinta-feira (14) na mesma unidade.
A primeira mesa, mediada pela gestora de artes cênicas Sonia Sobral, trouxe o jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto e a artista-pesquisadora Wlad Lima para debater o atual panorama político do Pará e as guerrilhas contemporâneas de seus moradores. “O Pará é um lugar complexo representado por imagens incompletas”, diz Sonia. “Queremos falar sobre o momento agudo do país, sobre quem se levanta para lutar hoje.”
Jornalista desde 1966, premiado e perseguido pelas denúncias publicadas em seu “Jornal Pessoal” na defesa dos direitos humanos e da Amazônia, Lúcio Flávio Pinto falou sobre os rumos da exploração econômica da Amazônia, que transforma o Brasil em um dos maiores destruidores de florestas do planeta, e a violência na região. “O grande problema da Amazônia é que não conseguimos vê-la. A Amazônia é o Brasil tardio, um corpo estranho que não consegue se incorporar”, explica.
Para Lúcio, não é fácil identificar um herói na região amazônica, sobretudo no estado do Pará. “Não temos nenhum herói, temos muitos canalhas. É difícil identificar heróis em uma região tão violenta, de crimes pavorosos.” Ele defende como solução para o futuro da Amazônia uma espécie de comunidade em que cientistas trabalhassem ao lado da população local e fizessem escolhas inteligentes para o uso da tecnologia. “É necessário o diálogo para o conhecimento. O pior erro é achar que entender a Amazônia é simples, porque é uma região rústica e primária. A Amazônia é complexa.”
Já Wlad Lima, artista-pesquisadora, atriz, diretora e cenógrafa em Belém (PA) colocou em evidência as dificuldades da classe artística em lidar com as políticas culturais do estado. Seu grupo leva o nome da palavra indígena “cuíra”, ou seja, “vontade de fazer alguma coisa”. “Essa inquietação representa o que nós vivemos e sentimos todos os dias naquele lugar”, diz. “Assim como os moradores do campo tem sua terra ameaçada todos os dias, nós também perdemos espaço. Vivemos uma guerrilha urbana.”
A professora da Universidade Federal do Pará também falou sobre a mentalidade colonizada da elite nortista e a necessidade de criar novas formas de pensar e formar artistas e pesquisadores na região. “A ação de falarmos com a própria língua é muito recente. Não consigo ter a dimensão da região em que vivo, porque toda informação que chega é filtrada. Minha guerrilha está em uma mente colonizada e colonizadora internamente.”
No fim, as perguntas da plateia levaram a uma reflexão sobre as diferenças e semelhanças entre o período da ditadura militar e o atual cenário político da região norte. Uma das espectadoras citou o filósofo marxista Paulo Arantes: “O que resta da ditadura? Simplesmente tudo. Tudo, menos a ditadura.”
PRÓXIMOS DEBATES
Como parte da programação “Arte – Substantivo Feminino”, o ciclo de conversas pretende desvendar temas envolvidos com o mote da peça, que recria a trajetória de 12 mulheres que lutaram e morreram na Guerrilha do Araguaia, um dos episódios mais violentos de repressão armada da ditadura militar, entre o fim da década de 1960 e meados dos anos 1970.
Na próxima quinta-feira (21), a atriz-MC Roberta Estrela D’Alva e Irene Maestro, militante do movimento Luta Popular falam sobre o tema “Mulher e Resistência”, com mediação de Georgette Fadel, diretora de “Guerrilheiras ou Para a terra não há desaparecidos”. A peça segue em cartaz até dia 31 de janeiro.
SERVIÇOS
Mulher e resistência
Mesa de debate no SESC Belenzinho – SP
21 de janeiro | 20h
Com Roberta Estrela D’Alva e Irene Maestro
Mediação: Georgette Fadel
➜ “Guerrilheiras ou Para a terra não há desaparecidos”. De 15 a 31 de janeiro de 2016. Sextas e sábados às 21h30. Domingos às 18h30. Ingressos de R$ 6 a R$ 20. Rua Padre Adelino, 1000 – Belenzinho, São Paulo – SP.
Por Mariana Payno.