União, transformação, conhecimento, resistência. Palavras que podem definir de forma geral um pouco do que aconteceu dentro das escolas ocupadas desde que o governador e São Paulo Geraldo Alckmin anunciou a “desorganização” escolar, no final de 2015. O movimento, que ficou conhecido como Primavera Secundarista, impediu o fechamento de centenas de salas de aula em São Paulo.
E não parou por aí. Sementes germinaram Brasil afora. Floresceu um jardim imenso cheio de Marias, Carlos, Gabis, laytons, Joanas e tantos outros carinhosamente chamados de secundas. Mudaram o rumo das coisas e mostraram ue luto para eles é verbo. Em 2016, quando o governo Temer impôs uma “deforma” no ensino médio e, ao mesmo tempo, congelou os investimentos na educação por 20 anos, uma nova onda de ocupações tomou o país. Estava decretado, os secundas tinham ganhado corações, mentes e apoio de toda a sociedade.
Além de revelar uma coragem expressiva, a primavera secundarista trouxe para a superfície uma rebeldia consequente estampada no rosto de cada jovem das ocupações. Familiares se uniram para doar alimentos, produtos de limpeza e higiene, colchões e cobertores. Professores disponibilizaram aulas gratuitas e artistas ofereceram atividades culturais. Tudo para que o movimento continuasse firme.
Foram semanas (em alguns casos, meses!) dormindo em colchões dentro das salas de aula, comendo o famoso macarrão e enfrentando direções de colégios autoritárias, além da pressão da Polícia Militar e a falsidade de uma mídia que muitas vezes não queria entender o que estava realmente acontecendo ali. Mas eles aprenderam que resistir é cuidar um do outro, todo dia. Dividiram tarefas, organizaram mutirões e rodas de conversa, dialogaram e aprenderam juntos.
Enquanto reivindicavam investimentos, democracia, liberdade e estrutura para a educação, as ocupações marcaram a vida de quem participava delas e chamaram a atenção de quem estava de fora, vendo pela televisão ou acompanhando nas redes sociais. O Brasil tinha mudado a partir daquele movimento.
Não à toa, a mobilização secundarista emocionou até os corações mais incrédulos. A experiência das ocupações deixou legados sobre a importância de valorizar a escola e os funcionários que trabalham nela, o respeito às pessoas independente das suas particularidades e ensinou cada estudante a compreender que a luta pelo que se acredita deve ser uma constante.
“Me tornei uma pessoa menos individualista e tive a maior aula de cidadania da vida. A ocupação mudou o olhar das pessoas sobre meu colégio que, por ser periférico, nunca tinha sido bem visto. Outras gerações poderão usufruir disso” — Crystina Sulliver, Colégio estadual Frentino Sackser (PR)
“Não me sinto uma líder, mas acabei sendo, neste processo. Sempre pensei em mudar as coisas, mas não sabia como. A ocupação trouxe oportunidade. Cresci, aprendi e reconheci muito mais o poder de uma mulher” — Larissa Shakur, Escola estadual Doutor João Ernesto Faggin (SP)
“Tinha acabado de chegar do Rio e trazia esta ideia das ocupações. Foi uma experiência que mudou minha vida. Nós, estudantes, passamos a interagir, conviver e nos entender” — Iza Fernandes, Escola estadual Sizenando Pechincha Filho (ES)
“Nossa ocupação era vista como ‘feminista’ por ter em sua maioria mulheres à frente. Nós ocupamos, resistimos, lutamos e batemos de frente com quem queria criminalizar o movimento. Com certeza mudou a relação entre as “minas” da escola e os garotos também” — Mariana Benigno, Centro de Ensino Médio 304 (DF)
• Gestão democrática: Durante as ocupações, os secundaristas tomavam decisões em assembleias. É importante que as instituições escutem os estudantes e que deixe-os participarem da construção do ambiente escolar.
• Temáticas que abordam o cotidiano da juventude: Temas como racismo, feminismo e LGBTfobia fazem parte da vida do jovem, tais pautas integraram – e muito – o dia a dia nas ocupações estudantis.
• Diálogo entre estudantes e a comunidade escolar: A união entre pais, professores e estudantes chamou atenção durante as ocupações. No entanto, casos de diretores autoritários eram bastante comuns. Abrir espaço para o diálogo pode solucionar problemas e até criar novas perspectivas de ensino.
• Participação de convidados e especialistas: Atividades com participação de convidados foram um ponto importante nas ocupações. O cartunista Laerte, a chef de cozinha Paolla Carosella, cantores como Chico Buarque e Tico Santa Cruz, foram apenas algumas das personalidades que visitaram escolas ocupadas e propuseram um “aulão” diferenciado.
• Mutirões para a melhoria do espaço escolar: Apesar do Estado ser obrigado a fornecer uma infraestrutura adequada e de qualidade para os jovens, os estudantes das ocupações mostraram que é possível realizar atividades para auxiliar na melhora dos ambientes.
Contra a falta e má qualidade da merenda escolar, estudantes paulistas ocuparam a Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP) e, após muita pressão, conquistaram a abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou o esquema de fraude e corrupção na compra de alimentos. “Mesmo com um relatório final que nfelizmente não puniu de fato os políticos envolvidos, os secundaristas foram responsáveis por expor a máfia da merenda”, explica Emerson Santos, presidente da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (UPES).