O projeto autodenominado “Escola Sem Partido” viola o direito à educação emancipatória e desrespeita o “princípio de proporcionalidade”, ou seja, não estabelece mecanismos para cumprir seu objetivo de “neutralidade” e pode apenas criar perseguições.
Isto é o que afirmou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso na liminar de 2017 que suspende o projeto em Alagoas, estado onde foi aprovado pelos deputados em 2016.
O julgamento definitivo do STF sobre este caso deve acontecer no final de novembro. Também está marcada para este mês a votação do relatório do Projeto de Lei 7180, a versão do “Escola sem Partido” no Congresso Nacional.
O que é
Com o pretexto de coibir “doutrinação política e ideológica” nas salas de aula, o projeto proíbe professores de abordar temas contrários às convicções das famílias dos alunos “nos aspectos relacionados à educação moral, sexual e religiosa”. Isto anularia discussões sobre homofobia ou racismo, por exemplo.
Enquanto defensores alegam que desta forma o ambiente escolar se tornaria mais isento, juristas afirmam que a mudança deve causar o contrário: criar escola com apenas um ponto de vista e uma educação que reforça violências sociais. Além disso, é natural que estudantes conheçam outras leituras de mundo e não apenas as presentes em casa.
Em sessão no STF nesta quarta (31/10), o ministro Alexandre de Moraes afirmou:
“Se o professor quer falar sobre nazismo, comunismo, ele tem o direito de falar, e os alunos têm o direito de debater e questionar. Como uma autoridade pode proibir a realização de uma aula que ainda irá ocorrer? Isso é censura prévia”
Veja por que o projeto desrespeita a Constituição Federal, segundo o ministro Luís Roberto Barroso afirma na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5537:
Estudante tem o direito de não só receber conteúdos, mas de ser formado para a cidadania: aprender a opinar, confrontar ideias, debater temas sociais
Artigos da Constituição violados: 205, 206 e 214
Como é o projeto:
Veda o professor de ensinar temas em discordância com as “convicções do aluno, de seus pais ou responsáveis”. A escola não pode abordar o termo “gênero” nem “orientação sexual”.
O que diz a Constituição:
Assegura uma educação emancipadora em um sistema inclusivo, que habilite a pessoa para os mais diversos âmbitos da vida, como ser humano, como cidadão, como profissional.
Define as diretrizes para isso, dentre elas a liberdade de aprender e de ensinar; o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; a valorização dos profissionais da educação escolar.
Conclusão do ministro Barroso:
“Para que a educação seja um instrumento de emancipação, é preciso ampliar o universo informacional e cultural do aluno, e não reduzi-lo, com a supressão de conteúdos políticos ou filosóficos, a pretexto de ser o estudante um ser ‘vulnerável’. O excesso de proteção não emancipa, o excesso de proteção infantiliza.”
Risco de perseguição a professores que não compartilhem das visões dominantes
Artigos da Constituição violados: 1º, 5º – LIV
O que diz o projeto:
Estudante tem direito à “educação moral livre de doutrinação política, religiosa e ideológica”. Professor é proibido de ter “condutas que imponham ou induzam nos alunos opiniões político-partidárias, religiosas ou filosóficas”.
Como é a Constituição:
Toda lei deve constituir instrumento apto à obtenção do fim que alega perseguir
Conclusão do ministro Barroso:
O nível de generalidade com que a lei é formulada gera um risco de aplicação seletiva e parcial das normas: “É tão vaga e genérica que pode se prestar à finalidade inversa: a imposição ideológica e a perseguição dos que dela divergem”.
Sobre o conceito de “neutralidade”, Barroso cita o Nobel da Paz de 1986, Elie Wiesel: “A neutralidade favorece o opressor, nunca a vítima. O silêncio encoraja o assédio, nunca o assediado”.