As entidades do setor educacional não tem tido tempo para respirar. Em poucos meses de “desgoverno”, Michel Temer já perpetrou inúmeras ameaças para o setor.
A Medida Provisória anunciada no mês de setembro que vai reformar o Ensino Médio pegou a comunidade escolar de surpresa. A medida autoritária, tomada sem nenhum diálogo com professores e estudantes, quer tornar optativas disciplinas cruciais para a formação do pensamento crítico, como sociologia e filosofia, além de querer instituir o ensino integral sem dizer como vai melhorar a estrutura nas escolas – que está sucateada- e promover uma verdadeira desprofissionalização dos professores, por não exigir formação pedagógica deles.
Na contramão dessas mudanças propostas pela MP, que demandam um maior investimento no setor, o mesmo governo aprovou em primeiro turno nesta segunda-feira (10) no plenário da Câmara dos Deputados, a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 241/16 que congela os gastos do governo federal por 20 anos e deverá ter impacto aterrador no financiamento da educação.
A PEC derruba a obrigatoriedade de o governo federal investir 18% do orçamento na educação e saúde, e aplica uma nova regra que vai calcular o gasto com base no que for investido nas duas áreas no orçamento de 2017 e aplicar ano a ano apenas correção pela variação da inflação.
Contra esses retrocessos do governo golpista, a Frente Povo Sem Medo, que reúne diversas entidades dos movimentos sociais e estudantil, entre elas a UNE e a UBES, convocou ato na Avenida Paulista para esta terça-feira (11). A manifestação que começou às 19h, com concentração no vão livre do MASP, contou com a presença de secundaristas, universitários, professores, trabalhadores e aposentados. O ato prestou apoio à ocupação dos estudantes realizada na noite de ontem (10), no escritório da Presidência da República em São Paulo, que durou 5 horas, para pressionar contra a aprovação da PEC.
“Um governo não eleito, ilegítimo está tomando uma decisão pelos próximos 20 anos, isso acarreta uma geração inteira de consequências. Um congelamento principalmente com foco na saúde na educação, sendo que ainda representa muito pouco dentro do orçamento já que o Brasil não investe como deveria nessas áreas”, afirmou Simone Nascimento, diretora de Assistência Estudantil da UNE.
Já o estudante secundarista Anderson Ribeiro, tesoureiro UPES, lembrou da sucessão de golpe, perdas e danos para os estudantes e toda a classe trabalhadora. “Nós vimos, na semana passada, a entrega do pré-sal, com a aprovação do projeto que prevê o fim do plano de partilha que dificulta o investimento de 75% dos royalties do pré-sal para a Educação, e também vimos a PEC 241, votada ontem, que ameaça as metas do Plano Nacional de Educação, grande conquista com muita luta do movimento estudantil”, diz
Para o professor de biologia da rede pública em São Paulo, José Albercir, a situação dos educadores tende a ficar pior caso a PEC 241 passe. “Vamos ver na prática o setor da Educação piorando. Primeiro, vamos ver ano a ano nosso salário perder valor de compra, sem o reajuste salarial de funcionários públicos que a PEC propõe. Além disso, se hoje já uma evasão de professores muito grande da rede pública, por falta de estrutura nas escolas e por que a profissão não tem um salário atraente, a tendência disso é se aprofundar com o congelamento dos investimentos em educação. A situação do setor, que já não é boa, tende a se tornar cada vez mais precária.”
O professor da Escola Estadual Pio Telles Peixoto, na Vila Jaraguá, Pedro Bernardes, também ressaltou a questão do salário e enfatizou: “ não sabemos se teremos emprego”.
Ele disse que os professores do Estado já receberam uma notificação da Secretaria da Educação dizendo que ano que vem ainda não tem novidade, mas 2018 teremos sim mudanças. “ Eu sou professor de arte, quer dizer que não vou mais dar aula para o ensino médio dessa disciplina. Se você deixa opcional a matéria quer dizer que não vai ter. Os meus alunos têm uma dificuldade financeira clara, logo entre estudar arte ou sociologia e ir para o curso técnico, eles vão para o curso. Esse é caráter mais cruel dessa reforma: brinca com a miséria da população, joga o jovem numa situação absurda de ter renunciar a uma formação cultural plena que o rico vai ter”.
A estudante de psicologia Julia Almeida, acredita que a Pec 241 é um desrespeito. “É tratar como se a gente fosse palhaço, como se a gente fosse burro porque a gente sabe que a educação está falida. Se antes a educação estava ameaçada, agora ela será entregue”.
Ela conta que a situação da universidade onde estuda, a Unesp, em São Paulo é preocupante. “O prédio está em ruínas e diante desse cenário a única saída é ir pra rua. Por isso estou aqui hoje”, conta.
Silvia Pereira é coordenadora pedagógica aposentada e acredita que congelar investimentos na educação é um ataque às classes menos favorecidas. “Isso será um prejuízo muito grande para os jovens, a educação precisa ser prioridade. O filho do trabalhador pôde finalmente entrar na universidade e isso não pode parar. Essa PEC é um retrocesso e nós temos que lutar contra” afirmou.
A diretora do Circuito Universitário de Cultura e Arte, o Cuca da UNE, estudante Camila Ribeiro destacou que todo o processo da mudança e da nova composição social da universidade está em cheque. “No último período diferentes setores da sociedade e diferentes sujeitos conseguiram acessar a universidade. A sala de aula é composta agora por diferentes classes sociais o que é muito importante para o nosso processo de formação cultural. Quando a gente restringe a universidade só a quem tem dinheiro para pagar isso cria um retrocesso civilizatório enquanto povo, o que é muito ruim”.
O diretor de Universidades Privadas da UNE, Josiel Rodrigues acredita que a tarefa do movimento estudantil e do conjunto dos estudantes é pra além da resistência, é também a linha de frente das mobilizações.
“É importante que as salas de aula sejam um espaço de debate para discussão do que está acontecendo, que os DCEs, CAs e grêmios estudantis estejam cada vez mais organizados e de fato debatam e organizem os estudantes para este próximo período. A batalha ainda não acabou, ainda temos mais um turno e o Senado, e podemos ter um papel protagonista na disputa de ideias dentro das instituições de ensino”.